Trecho da apresentação:
Bem-estar é um produto? Se bem-estar é um estado, algo cultivado, como é que isso pode virar um produto? Então essa é a primeira questão, que não é uma questão simples e nem é uma questão respondida, e na verdade dentro do contexto do consumo é uma das áreas mais complexas para empresas atuarem, justamente porque não é simples você falar, tratar bem-estar como um produto. Isso começou a ocorrer quando a questão do tempo se tornou um bem para as pessoas, passou a ser algo que as pessoas atribuem valor, e a escassez de tempo faz com que as pessoas encaixem o bem-estar num tempo curto e determinado, como um item da agenda. É interessante perceber essa expectativa de ter bem-estar num tempo determinado.
O que pude concluir em muitas pesquisas sobre bem-estar em diferentes países é que existem alguns parâmetros, algumas referências do que é bem-estar, e de que práticas levam ao bem-estar. Alguns veem bem-estar pelo aspecto puramente corporal, estético, físico. Vão para uma academia malhar e construir um corpo perfeito. Tem gente que vê bem-estar na área da massagem, do prazer também mais físico, pode entrar o energético aí, mas no sentido mais passivo, receber algum tipo de um tratamento, de anti-stress. Tem gente que vê o bem-estar como uma atitude afirmativa, você é o sujeito do seu bem-estar, você escolhe como vai viver. Tem uma outra área do bem-estar, que é você procurar o bem-estar através da interlocução, através da conversa. E tem o bem-estar relacionado ao místico, ao esotérico, atribuir o bem-estar a alguma coisa externa superior, algum tipo de crença.
É interessante perceber que o espaço de ‘mercado’ ocupado pela psicoterapia no momento de uma escolha financeira é esse do bem-estar relacionado à conversas, concorrendo na cabeça das pessoas com spas, academias, meditação, etc.., algo que é ‘encaixado’ na agenda para manutenção do bem-estar. A pessoa pensa: será que faço terapia ou uma massagem, será que faço terapia ou vou para a academia? Que apito vou tocar?”
Roberto Straub
Trecho da discussão:
Gustavo Barcellos: Todas as informações que Beto está trazendo sobre esse consumidor são importantes para nós psicólogos porque nos dão uma imagem de quem é o cidadão, quais são seus hábitos de consumo e como ele está se comportando, porque esse cidadão está dentro do nosso consultório. Então nós não podemos como terapeutas lidar com um sujeito que não existe mais, que é o sujeito de século 19, do século 20, é uma idéia romântica, a psicologia fica com a idéia de um sujeito que já era, que não existe mais. Essa pessoa não está na sua frente para fazer psicoterapia. Então eu acho que as informações deste Encontro estão sendo muito importantes por causa disso, Beto, eu agradeço muito o seu trabalho por causa disso, porque pode nos atualizar. E eu acho mais, acho que a psicologia fica muito para trás se comparada com as outras atividades. E digo mais ainda, eu acho que o Beto está trazendo uma coisa importante da qual a gente tem que ter consciência, que já se falou aqui de alguma forma, de que nós da “psicoterapia” entramos numa cadeia de concorrência de bem-estar. Então essa história, “vou fazer academia, ou vou fazer psicoterapia?”, eu já escutei de paciente, de amigo, nós estamos incluídos nessa ansiedade. Então é importante ter consciência de que sujeito é este, que cidadão é este que está entrando e sentando na nossa frente para um trabalho de psicoterapia.
Roberto Leal: O Roberto está apontando que o brasileiro tem este recurso do bem-estar. Esta é uma dica tremenda para a psicoterapia.
Roberto Straub: Depois que eu comecei a fazer essas pesquisas, passei a dar um valor que eu não dava a ser brasileiro e estar no Brasil. Porque você vê, quando vai para a Bahia, o caráter da gente, o caráter do país. E você sempre tem essa opção de dar uma risada, dar uma sambada, uma pulada, isso é um recurso que você vê.
Hermenegildo Anjos: Isso é alta tecnologia psíquica, aprender a viver sem remar contra a maré, de acordo com os movimentos, é alta tecnologia psicológica. E isso é artigo de consumo, está se identificando que isso é um grande artigo de estudo para o consumo.
Ita Wilde: Fiquei pensando no paradoxo, na coisa da alma, fala-se muito em globalização, e o Beto me trouxe o culto ao paganismo novamente, porque se ele está falando de localidade, ele está falando de uma coisa pagã. Então, me deu essa sensação realmente da recuperação do olhar para a alma, eu tenho a sensação de que você está falando nisso o tempo todo. Vem uma idéia libertadora dizendo assim que a própria propaganda hoje pensa diferente, você é responsável pelo seu consumo, ou essa é a tendência, e é uma cultura ao paganismo, ou seja, você é situado no seu local e o mundo precisa responder a isso, não se pode mais olhar tudo como uma coisa só.