Trecho da apresentação:
Sentimentos cognitivos novos andam me invadindo. Estou envolvida em estudos que acompanham a fascinação natural das imagens da psique, o que tem me embriagado de ideias e de sensações novas. Então, um movimento novo — e inclusive incomodativo — tem me lançado em ensaios provisórios que me desafiam e me obrigam a exercícios de síntese e de exposição.
Há um Eros fraterno — também presente nos nossos encontros de estudos — nos textos de James Hillman. Há neles uma releitura do psicológico que vai dissolvendo analiticamente e ao mesmo tempo recuperando eroticamente elementos essenciais de Jung, ressaltando aspectos de profundidade e leveza. Isso tem despertado em mim um olhar reflexivo mais apurado e a necessidade de uma atitude terapêutica mais redentora.
Conexões de ideias diversas e ao mesmo tempo potencialmente integradoras têm me feito criar em tear particular, e artesanalmente, novas tramas eróticas para o meu trabalho como psicoterapeuta, desviando-me de receitas prontas, de roteiros teóricos antigos e instituindo novas padronagens. Estou entregue ao meu próprio politeísmo de possibilidades.
Eros está em meio a conexões instituintes. A mente movimenta-se deslizando, enredando-se ou impactando-se com as imagens amorosas que sugerem cenas fascinantes a se realizar. Para mim são modulações eróticas de conexões instituintes. As fixações são o instituído, organizações que com o tempo tendem a perder a mobilidade e, portanto a alma. Tornam-se absolutismos paralizantes.
Isabel Labriola
Trecho da discussão:
Isabel Labriola: o trabalho de sandplay me ajuda muito a resolver a questão de trabalhar com a imagem, que Hillman me oferece. Como disse, tenho experimentado também algumas ousadias com a técnica de imaginação ativa e com o trabalho a partir de novos estudos da psiconeuroimunologia com imagens. E aqui o salto imaginativo parece mais exagerado ou desajeitado, mas eu ouso experimentar. A psiconeuroimunologia trabalha com imagens para resolver a questão de doenças auto-imunes, câncer, coração. E fica difícil fazer as conexões com Hillman, porque é um corpo tão clínico, concreto. Como vou fazer uma composição? Entretanto, aqui também encontro dados, possibilidades muito instigantes e fascinantes. Também entro em contato com um padrão de funcionamento neurológico, viciado ou não, onde a alma está e se estabelece. Ela manda mensagens claras de doenças físicas, de chagas para o corpo. A mente está sempre hipnotizada pela sua imagem, pela imagem que está dentro e fora dela, a mente é hipnotizável, ela é hipnotizada o tempo inteiro.
Hermenegildo Anjos: Muito bonita sua apresentação, ela me remeteu a uma imagem, que talvez seja a coisa mais difícil, mas é talvez um requinte, a sofisticação de um trabalho mais imaginal que, na verdade, é uma coisa tão elementar que aprendemos desde o início e não percebemos a sua profundidade, que é a noção, ou a necessidade, de se desidentificar de si mesmo. Porque estamos muito identificados com a gente mesmo, ou com aquilo que imaginamos ser o nosso ego. Somos muito presos a isso. E aprendemos, na primeira lição de psicologia, que ego é apenas uma pequena parte da alma, da psique como um todo. Mas apesar de ser uma visão tão elementar, persistimos nessa identificação.
Roberto Gambini: Eu queria fazer um comentário. Gostei muito do que você falou e vai ficando claro que entrar por esse caminho do lugar das imagens na psique acaba gerando um conhecimento de como a mente funciona, não se baseando numa teoria da meditação, ou numa teoria psicológica… Podemos descobrir como a mente funciona, e acho que você falou uma coisa importantíssima que é a questão da hipnose, quando disse que a mente fica hipnotizada. A mente fica hipnotizada pelas imagens e pelos complexos que se lhe impõem, e ela sofre, uma porque ela está fixa, e outra porque o conteúdo dos complexos pode ser terrível. E todos temos complexos. Eles nos hipnotizam várias horas por dia para que a nossa mente fique igual a um passarinho diante da serpente, só com aquelas imagens — terríveis ou não, mas hipnotizadoras. Então para mim, a clínica arquetípica é a que des-hipnotiza. Você libera o passarinho do olhar da serpente e daí ele cai na polissemia, no politeísmo, nas águas, aonde você quiser. Quer dizer, precisa libertar o passarinho hipnotizado.
Roberto Straub: Hermenegildo falou uma coisa que eu acho muito importante: até a fala da Isabel eu não havia sentido que tínhamos resgatado uma coisa que para mim ficou muito impactante no outro Encontro. E é essa coragem de sair da posição de terapeuta, da posição qualquer que seja e entrar junto, e viajar junto com todos os riscos inerentes a essa viagem, de quem está diante da pessoa e não sabe o que vai acontecer, nem com ela e nem com você, assumir essa dúvida, e, ao mesmo tempo, ela aponta uma coisa interessante que é dentro de um espaço, de um ritual, do sagrado, um espaço construído. Então um ponto do que a gente estava falando pela manhã é essa necessidade de se estabelecer um limite para a prática, mas isso não significa ficar preso a nenhum tipo de teoria, ou de sistematização, ou de um pensamento outro que não o seu mesmo. Então eu vejo na Bel, e na sua fala, a coragem de entrar nesse universo e nessa viagem, que acho é a grande diferença entre psicologia arquetípica e tudo que eu conheço: justamente essa liberdade… Você usou a palavra “arejar”, “arejamento”. É só nesse terreno que você consegue libertar alguém do fascínio do passarinho diante da serpente.
Isabel Labriola: Conexão instituinte é isso gente. Só fazemos uma conexão instituinte se estivermos nesse espaço livre, protegido e fraterno, de horizontalidade, de prática imaginal. E aí tem um eros estimulante para a nossa imaginação. Por isso eu falei: com essa platéia não tem jeito, tem que ser verdadeira, tem que ser “ou dá ou desce”.
Gustavo Barcellos: Vejo que Isabel falou disso: o que a ausência da instituição propicia, e nós estamos aqui com a ausência da instituição, nos instituindo, “conexões instituintes”. Acho que isso fez, faz e está fazendo toda a diferença.
Roberto Gambini: Talvez pudéssemos dizer que a instituição é inimiga da imagem. Porque ela tem medo da imagem, a instituição decreta a imagem oficial. E ela não tem outras. Portanto, quando prevalece a instituição, não há espaço para a imagem, porque no fundo a instituição tem medo delas.
Áurea Roitman: É o logo-tipo.