Trecho da apresentação:
Faz tanto tempo isso, mas parece que foi ontem ou ainda está sendo. Era uma cigana de uns vinte e poucos anos, vestida com muitas saias, muitos colares, uma roupa de festa — talvez festas de que sempre quis participar. Insistia em convites para danças de quarto e de cabeceiras. Fecho portas, abro portas e lá estava ela como um sonho, dando ordens!
Que povo é esse? Quem é essa mulher? Quem é essa gente? Não gosto deles. Eles existem?
Vamos para Sevilha! E isto não é um convite, é uma ordem. Vôo de Maiorca para Sevilha. Desta vez, outra cigana senta-se ao meu lado, olho esquivamente, com medo. Quem é essa mulher? Era uma senhora, gorda, vestida toda de preto, tranquila, serena. Isso me acalmava. Olhava diretamente para mim se dizendo cigana e se propondo a me acompanhar na viagem. Cigana de preto? Hummm… Bom, acreditei nela, tamanha era sua presença e força. Ela se fez constante durante 17 dias de Sevilha.
Kathia Nascimento
Trecho da discussão:
Hermenegildo Anjos: Mas Kathia, acho que você não deveria contar essa imagem do cigano, do povo cigano, na sua experiência emocional, como apenas mais uma imagem. Porque ela é muito especifica: é cigano, é povo cigano. Então acho que você tem razão em dizer que isso na verdade é um material virgem ainda para você. É um material que tem ainda muito a se explorar. Acho que você ainda tem muito a aprender com o povo cigano. Se prepare.
Kathia Nascimento: Mas o que quis trazer de verdade é o quanto a loucura, se a gente cuida dessas imagens e do mundo morto, o quanto elas são bússolas, são sagradas. Eu acho que nós enquanto pessoas, enquanto psicoterapeutas, merecemos dar mais respeito a essas coisas que nos falam, do modo como nos chegam, a botar o ouvido, botar o faro um pouco melhor. E os olhos ficam assim meio sem olhar direito, o intelecto fica meio besta, porque acho que tem muita coisa preciosa que é falada, sussurrada.